Em janeiro de 2010, realizou-se em Porto Alegre (e cidades vizinhas) o Fórum Social Mundial. Nascido como uma alternativa ao Fórum Econômico de Davos, o lema que orienta seus idealizadores é a convicção de que “um outro mundo é possível”, com a economia a serviço do social. Para conhecer um pouco mais o que acontece atrás dos bastidores da his-tória, é bom saber que, enquanto o Fórum Social alcançou, aos trancos e barrancos, a sua 10ª edição, o Fórum Econômico chegou à 40ª, o que prova que o econômico preme mais que o social.
Contudo, seria grande ingenuidade negar: tudo, no mundo, gira em torno da economi-a. É ela que se oculta atrás das decisões que se tomam em encontros de chefes de Estado. Nenhum poder – nem mesmo o religioso – foge de sua influência. A maior parte dos pro-blemas que afligem as pessoas, as famílias e a sociedade nasce exatamente desta perversa inversão de valores em que o dinheiro ocupa o primeiro lugar. É assim que, enquanto uns morrem – física, psíquica e espiritualmente – porque possuem tudo o que querem, outros não sabem a que santo recorrer para fazer frente a necessidades que se tornam calamidades pela falta de recursos financeiros.
É nesta realidade que se insere a Campanha da Fraternidade de 2010, desta vez orga-nizada e assumida não apenas pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, mas pelo Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil, formado por seis confissões religiosas: Igreja Católica Apostólica Romana, Igreja Cristã Reformada, Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, Igreja Sírio-Ortodoxa do Brasil e Igreja Presbiteriana Unida.
O tema escolhido é “Economia e Vida”, e o lema: “Não podeis servir a Deus e ao di-nheiro”. O objetivo da Campanha é conscientizar a sociedade sobre um dos aspectos mais importantes de sua organização, não apenas para a manutenção da ordem, da justiça e da paz, mas até mesmo para a própria sobrevivência da humanidade. Numa palavra, trata-se de colocar a economia no seu devido lugar, a serviço do verdadeiro desenvolvimento, onde a pessoa esteja no centro, e a riqueza – que é sempre fruto do trabalho de todos – tenha como finalidade o bem-comum. Quando isso não acontece, ela acaba nas mãos dos mais fortes – senão dos mais corruptos –, jogando na miséria um número cada vez maior de pessoas, de famílias, de empresas e de nações.
Em relação à sua doutrina social, a Igreja Católica sofreu uma forte guinada a partir da “Rerum Novarum” de Leão XIII, publicada a 15 de maio de 1891, guinada que se acentuou nos anos que se seguiram. De fato, em sua Carta Encíclica “Caritas in Veritate”, de 29 de junho de 2009, Bento XVI já fala de “democracia econômica”: «A vida econômica deve ser entendida como uma realidade de várias dimensões. Em todas deve estar presente, embora em medida diversa e com modalidades específicas, o aspecto da reciprocidade fraterna. Na época da globalização, a atividade econômica não pode prescindir da gratuidade, que difunde e alimenta a solidariedade e a responsabilidade pela justiça e o bem comum em seus diversos sujeitos e atores. Trata-se, em última análise, de uma forma concreta e profunda de democracia econômica. A solidariedade exige que todos se sintam responsáveis por todos, e não pode ser delegada apenas ao Estado»
Em suma, uma economia à medida do homem e do planeta, que não pode prescindir da parcimônia e da frugalidade, como propugnava, há mais de três décadas, Albert Tévoéd-jré em sua famosa obra: “A Pobreza, Riqueza dos Povos”. É nesse sentido que permanece atual a crítica que Cristóvam Buarque dirige à burguesia do Brasil: «Os brasileiros ricos são pobres. São pobres porque compram sofisticados automóveis importados, mas ficam horas engarrafados ao lado dos ônibus de subúrbio. E, às vezes, são assaltados, sequestrados ou mortos nos sinais de trânsito. Presenteiam belos carros a seus filhos e não dormem tranquilos enquanto eles não chegam em casa. Pagam fortunas para construir modernas mansões, desenhadas por arquitetos de renome, e são obrigados a escondê-las atrás de muralhas».
Pelo instinto de sobrevivência que o domina, o ser humano é capitalista por natureza, sempre propenso a acumular, somar e multiplicar. Mas, se não aprender a dividir e partilhar, perderá a única riqueza capaz de libertá-lo, promovê-lo e realizá-lo, e o “outro mundo pos-sível” ficará para as calendas gregas!
Dom Redovino Rizzardo
Fonte: Site da Conferência Nacional dos Bispo do Brasil
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